DANO AMBIENTAL PRESUMIDO GERA DEVER INDENIZATÓRIO?
- André Tolentino
- 16 de mai. de 2024
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Segundo a sistemática estabelecida em nosso ordenamento jurídico, o causador de um determinado dano ambiental tem o dever de repará-lo. Em regra, a reparação se dá pela recuperação ambiental, buscando restabelecer o status quo ante. Quando a recuperação integral não for possível, impõe-se ao responsável o dever de compensar o dano e, em último caso, indenizá-lo. O sistema vigente visa a restauração do equilíbrio ecológico, e, caso não seja possível, exige-se do causador o pagamento de valor pecuniário proporcional à parcela do dano irrecuperável, que deverá ser destinado a programas ambientais.
Este entendimento encontra respaldo na doutrina e em julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como o REsp 1.198.727/MG, de relatoria do Eminente Ministro Herman Benjamin. Poder-se-ia presumir que o dever indenizatório só seria imposto após a constatação do dano, a aferição de sua extensão e a impossibilidade de recuperação ou compensação integral.
Nesse sentido, o STJ, no REsp 1.382.999/SC, asseverou que a indenização não é automática, sendo devida apenas quando há dano remanescente ou reflexo após a restauração. Assim, a condenação ao dever indenizatório deve ser precedida de comprovação do dano e da correta aferição de sua extensão, pois a indenização é uma compensação pecuniária proporcional ao dano:
“O Superior Tribunal de Justiça tem externado o entendimento de que as ações de obrigação de fazer podem ser cumuladas com as indenizatórias; e que nem sempre a recomposição da área degradada ou o saneamento do dano provocado ilide a necessidade de indenização. Todavia, esse entendimento não implica a conclusão de que, sempre, será devida a indenização, pois, quando é possível a completa restauração, sem que se verifique ter havido dano remanescente ou reflexo, não há falar em indenização.”
Diante desse entendimento, parece lógico que a condenação em um dever indenizatório deve ser precedida de comprovação de dano ambiental e da correta aferição de sua extensão. Até mesmo porque, a indenização é uma compensação pecuniária pelo dano experimentado, de modo que deve guardar proporcionalidade e ele.
Entendimento Recente do STJ
Todavia, em recente julgado, a Segunda Turma do STJ admitiu a indenização por dano ambiental mesmo sem prova de prejuízo (REsp 2065347/PE).
No caso, em que se analisou o lançamento, por uma restaurante, de esgoto no rio Capiberibe (PE), sem qualquer tipo de tratamento, a Corte Cidadã reformou acordão proferido pelo TRF5 – que havia decidido pela improcedência da pretensão indenizatória em razão da falta de perícia sobre eventuais danos ambientais – restabelecendo a sentença condenatória.
A justificativa foi que o dano ambiental era notório, dispensando perícia, e que o ônus da prova se inverte nesses casos, cabendo ao infrator provar que sua ação não causou dano. Diante de dano notório ou que se dissipa rapidamente, como na poluição da água, a perícia seria desnecessária:
Diante de dano ambiental notório ou de modalidade que se dissipa rapidamente no ambiente, algo corriqueiro na poluição do ar e da água, desnecessária, como regra, a realização de perícia para a sua constatação, haja vista que seria diligência inútil e meramente protelatória (art. 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Nesses casos, basta a prova da conduta imputada ao agente. Cabe acentuar que o dano ambiental notório inverte o ônus da prova da causalidade e do prejuízo, incumbindo ao transgressor demonstrar que do seu malsinado procedimento específico não resultaram os impactos negativos normalmente a ele associados.
Implicações do Novo Entendimento
Ocorre que, dispensar a quantificação do dano e a possibilidade de reparação, partindo-se diretamente para a indenização, a condenação assume caráter pedagógico/punitivo, escapando da lógica de restabelecimento do equilíbrio ecológico, que deveria permear esse tipo de condenação.
Vale lembrar que o restaurante em questão pode (como efetivamente o foi) ser responsabilizado na seara administrativa, mediante a aplicação de pena de multa e adoção de outras medidas administrativas, como embargo da atividade e do estabelecimento.
Da mesma forma, diante da violação das normas jurídicas (lançamento de esgoto sem tratamento em corpo hídrico), o restaurante e seus responsáveis poderiam ser responsabilizados na esfera criminal, desde que, naturalmente, estivessem presentes todos os elementos do tipo penal correspondente.
Essas duas áreas, sim, possuem natureza punitiva/pedagógica.
Ao se aplicar pena indenizatória de cunho meramente pedagógico, pode ter havido desvirtuamento do estatuto indenizatório aplicável ao direito do meio ambiente e caracterizar bis in idem, uma vez que a punição pecuniária (multa) já havia sido aplicada na esfera administrativa.
De todo modo, respondendo ao questionamento proposto acima, pode-se afirmar que sim, a mera presunção de dano ambiental, segundo o recente entendimento defendido pelo STJ, gera dever indenizatório.



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